Boletim

BOLETIM JANEIRO/2020

A cidade do Rio de Janeiro apresentou um total de 12 conflitos no mês de janeiro de 2020, sendo que a maioria se concentrou em bairros do Centro e da Zona Sul da cidade como: Paquetá 3, Botafogo 2, Gamboa 2, Copacabana2, Leblon1, Estácio 1. Desse total tivemos uma diversidade de objetos muito significativa com três casos envolvendo o objeto “transporte, trânsito e circulação”, dois casos categorizados como “acesso e uso do espaço público”, três casos referentes ao “patrimônio histórico”, um caso de “água e esgoto” e um relacionado ao objeto “rios, lagoas e praias”

Os conflitos relacionados ao transporte se colocaram criticamente à uma decisão do governo do estado de reduzir o horário de funcionamento das barcas, única possibilidade de transporte público para os moradores da Ilha de Paquetá. O movimento, que lutava pelo direito de ir e vir da população, tornou pública sua revolta com a decisão governamental através de uma página no Facebook "Respeita Paquetá". Espaço virtual em que é possível conferir relatos de apoio ao movimento dos moradores, alguns conhecidos e respeitados há mais tempo, como o músico Chico Buarque e a atriz Soraya Ravenle. Como o número de viagens reduzido, o tempo de espera entre uma embarcação e outra afetaria diversos setores da região como a educação, economia, turismo e saúde. Segundo a moradora Ialê, algumas grávidas e enfermos faziam a travessia de barca para embarcar em ambulâncias na Praça XV. Mas o tempo é crucial para o salvamento dessas pessoas, que teriam que esperar mais por atendimento.

Esse conflito continuou com moradores da Ilha do Governador e de Paquetá que voltaram a se manifestar, ocupando no dia 24 de janeiro a frente do Palácio Guanabara, em Laranjeiras, na Zona Sul, para protestar contra a mudança na grade de horários das barcas. A alteração foi anunciada no dia 23 de dezembro e chegou a ser adiada três vezes.

Em nota, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro informou que vai recorrer da decisão. "A Defensoria entende que moradores e passageiros devem participar do processo decisório para minorar os impactos no transporte aquaviário". Ainda organizaram, na manhã do dia 30 de janeiro, um café da manhã em frente ao terminal das barcas, na Praça XV, no Centro do Rio para reivindicar a mudança de horários das barcas para a ilha. Com uma mesa com bolo e refrigerantes e uma cadeira com uma faixa, os moradores se reuniram para esperar o governador Wilson Witzel, que não compareceu. O morador e comerciante da ilha, Maurício Castelhanos, reforçou a insatisfação de quem vive em Paquetá. Segundo ele, a manifestação contou com cerca de 100 pessoas que estavam preocupadas com os impactos causados pela mudança de horário no transporte, que tinha começado a valer no sábado anterior.

Os dois conflitos referentes ao objeto “acesso e uso do espaço público” envolveram um grupo de jovens negros que estavam na Pedra do Sal e foram impedidos de usar o banheiro do estabelecimento por clientes brancos. Os jovens prestaram depoimento na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (DECRADI), na Lapa. A agressão teria ocorrido na madrugada do dia 11 de janeiro em um local representativo da cultura afro-brasileira no Rio e reconhecido como patrimônio cultural da cidade, a Pequena África. "Por sermos pessoas negras em um local que historicamente tem importância para o movimento negro, a gente não se sentir confortável no nosso espaço é horrível", afirmou Andrea Bak, um dos cinco jovens agredidas. Ela contou que foi espancada com uma barra de ferro na cabeça e levou um soco no olho. No dia 13 de janeiro, durante o depoimento na DECRADI, o grupo foi acompanhado por membros da Comissão de Direitos Humanos da OAB. O procurador da comissão, Rodrigo Mondego, apontou que, além de indícios de racismo, o caso também apresentou intolerância com a comunidade LGBT e avaliava se tratar de um caso de linchamento.

Um destaque importante desse janeiro foram os casos envolvendo a questão do patrimônio histórico, a ameaça de fechamento definitivo do teatro Casa Grande no Leblon, considerado um marco na resistência artística e cultural da época da ditadura militar mobilizou diversos artistas. Cerca de 200 pessoas realizaram um abraço simbólico no teatro e levantaram cartazes com o propósito de criticar o fechamento da casa. Maior teatro da região, o Casa Grande é privado, porém foi construído em um terreno público e é tombado pelo Estado. Com a indefinição da utilização do espaço, a classe teatral temia o fechamento do teatro e criticavam as decisões arbitrarias do governo federal de mudar a direção e dessa forma intervir em dois importantes espaços culturais da cidade do Rio de Janeiro, desrespeitando pesquisadores e funcionários terceirizados.

A Fundação Casa de Rui Barbosa, em Botafogo, também foi tema das manifestações do objeto “patrimônio histórico”. Instituição pública federal, vinculada ao atual Ministério da Cidadania e Turismo, a Casa Rui oferece um espaço reservado ao trabalho intelectual, à consulta de livros e documentos, e à preservação da memória nacional. Com o afastamento de pesquisadores e o fechamento dos portões, funcionários proferiram em voz alta uma carta contra a medida da administração do museu e contra a paralisação sem aviso prévio de atividades como atendimento a refugiados bolsistas por Direito. Em frente à Fundação, os manifestantes gritavam palavras de ordem como “A Casa Rui Barbosa é nossa”, “Fora Letícia Dornelles”, com referência a então presidência da casa. No ato, a rua ficou fechada e acompanhada pela PM. A carta aberta lida no ato, funcionários denunciava as exonerações realizadas recentemente, bem como a censura a comentários nas redes sociais do instituto e se encerrava com o pedido de reversão das exonerações e afastamentos. A Associação dos servidores da Fundação Casa de Rui Barbosa prometeu convocar uma assembleia no mesmo dia para planejarem os próximos passos.

O terceiro conflito deste objeto envolveu funcionários e apoiadores da Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro que realizaram um ato para protestar contra o comportamento da direção da instituição que teria agido de forma racista com um de seus funcionários. Segundo a organização ¨Círculo Laranja¨, no dia 10 de janeiro, um dos funcionários terceirizado da limpeza teria sofrido discriminação, constrangimento e assédio moral por Tania Pacheco, diretora do Museu. De acordo com uma carta-manifesto lançada na internet, a motivação teria surgido quando o funcionário da limpeza foi impedido de utilizar o elevador social, sendo expulso do local aos berros pela própria diretora da Biblioteca. No dia 31 de janeiro, funcionários terceirizados ocuparam a entrada da Biblioteca e espalharam faixas e distribuíram cópias do manifesto aos passantes. Uma das faixas dizia: “Discriminação e preconceito uma triste realidade, repudiamos o ato praticado pela servidora pública da Biblioteca Nacional. Feriu as leis 1390 e a 7437/85. Basta!”

A qualidade da água fornecida pela Cedae foi a causa de um conflito registrado no mês de janeiro no bairro do Estácio. Manifestantes realizaram um protesto em frente à sede da Cedae (Companhia de distribuição de água no município), no Centro do Rio de Janeiro. Os manifestantes reclamavam da qualidade da água distribuída para a população do Rio e criticavam o plano de privatização da empresa estadual. A chamada crise da água na cidade já vinha afetando os moradores havia pelo menos 15 dias. A manifestação foi organizada por movimentos populares e sindicais, como o Sindicato dos Trabalhadores em Saneamento e Meio Ambiente do Rio de Janeiro (Sintsama-RJ), Central Única do Trabalhador (CUT), Frente Popular Brasil e Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB). Também estiveram no ato funcionários da Cedae e representes de associações de moradores.

Imagens públicas disponíveis em diferentes sites da internet.